sábado, 27 de junho de 2015

Montevideu: Impressões da capital mais pitoresca dentre as que conheci na América Latina



MONTEVIDEO – DIA 17/02/2015


No último dia da minha viagem em solo uruguaio, deixei para explorar o máximo possível da capital. Algumas das impressões que ficaram depois da viagem foram a de que Montevideo sem dúvida nenhuma é uma cidade grande e dinâmica, mas ainda conserva em vários aspectos um ar mais interiorano, pacato, do que outras capitais como Buenos Aires e Santiago. O comercio de rua raramente se concentra em uma única rua, é esparso pelos bairros e muitos são especialistas em acessórios e atividades que são bem difíceis de encontrar nos dias de hoje, como videolocadora com VHS e lojas de acessórios para controle remoto e antenas parabólicas. Mais um sinal de que aqui o tempo parece rodar mais devagar. Por todos os cantos da área central se avistam construções antigas como casarões e edifícios da primeira metade do século XX, a maioria não muito bem conservada, verdade, mais devido à ação do tempo do que vandalismo. 

Rua na Cidade Velha














1-Circulação dentro de Montevideo:
Como nas grandes cidades do Brasil há um monte de empresas que operam as linhas de ônibus de Montevideo, cada uma com sua cor. Uma das mais conhecidas lá – e a que eu mais utilizei- é a CUTCSA, de cores branca e azul, pois ela opera as linhas mais utilizadas pelos turistas dentro da cidade entre o Centro, o Terminal Tres Cruces, o Estádio Centenário e para os bairros de Pocitos e Punta Carretas. A maioria dos ônibus foi fabricada no Brasil, é muito forte a presença das carrocerias Marcopolo, Caio e Busscar, e alguns ônibus de carroceria argentina também são avistados aqui e ali.
Ônibus da Cutcsa na Plaza Independencia

A frente do ônibus mostra apenas o número e o destino, informações sobre o itinerário só na base da pergunta para o motorista. A entrada é pela frente, todos possuem cobrador e a tarifa varia de acordo com o tamanho da linha, na época entre 17 e 25 pesos. Podem ser comprados também bilhetes de ida e volta na mesma linha por 40 pesos, válidos pelo dia todo, e de integração total com outras linhas por 48 pesos e válido por 2 horas após o cobrador estampar o bilhete. Curiosidade que todas as janelas têm cortinas e há somente um botão da cigarra, sempre junto à porta de saída na traseira. Há ônibus bem antigos rodando ainda em muitas empresas, mas eles não necessariamente são sinônimos de uma viagem ruim, pelo contrário, a qualidade da conservação é impressionante. Andei lá em ônibus com mais de 20 anos de uso nas costas que não rangia um pio sequer, aparentemente foram comprados 0 km. Faz parte daquela sensação de que o tempo passa mais devagar lá.
Ônibus de carroceria Caio Vitória: Típico dos anos 90

 Os pontos de ônibus lá são bem parecidos aos daqui, identificados com o número das linhas que são atendidas ali, alguns tem bancos para sentar, outros só o poste indicativo. Há faixas exclusivas para ônibus nas ruas do Centro.
A maioria das linhas rumo ao Centro ou faz ponto final no final da Cidade Velha, localizada na ponta que avança sobre o Rio da Prata, ou é circular na Plaza Independencia, geralmente com o letreiro Ciudadela. De um lado da Cidade Velha está o Porto de Montevideo, voltado para a baía, com movimento intenso de embarcações cargueiras e algumas saídas do Buquebus para Buenos Aires e do outro está a Rambla, o calçadão a beira-rio quase mar.
Em Montevideo, os taxis são da cor branca e que nem no Brasil o preço é estabelecido no taxímetro. A maioria das ruas é razoavelmente plana, ladeadas por grandes árvores, convidativas para a caminhada.

2-MANHÃ
Comecei o dia fazendo o check-out do Hostel Montevideo Up por volta das 9:00. O tempo estava bem agradável, sol sem nuvens e com a brisa soprando da orla. Peguei o ônibus até o Terminal Tres Cruces e deixei minha mochila no guarda-volumes do terminal. De lá, peguei o ônibus CA 1, que atravessa todo o centro de Montevideo até a Cidade Velha por 17 pesos, que desceu toda a Avenida 18 de Julho, Praça Independencia e seguiu pela Cidade Velha até o Mercado del Puerto.
Desci próximo ao Mercado del Puerto, ponto turístico movimentado da cidade famoso pelos restaurantes e seus churrascos grelhados na hora na parrilla (churrasqueira enorme utilizada por argentinos e uruguaios), como ainda era cedo estava bem vazio.
Mercado del Puerto
Decidi voltar lá mais tarde, na hora do almoço. Segui caminhando pelas peatonais (calçadões) Perez Castellano e Sarandi, que atravessam a Cidade Velha ligando o Mercado a Plaza Independencia. Pelo caminho há bastante comércio e camelôs vendendo souvenirs. Dei um pequeno desvio para passar na Plaza Zaballa, com um agradável jardim homenageando um dos heróis da independência uruguaia.
Ciudad Vieja
A arquitetura da Cidade Velha remete ao final do Século XIX e começo do XX, com prédios imponentes, mas não muito bem conservados, as ruas mais próximas ao porto concentram alguns bem decrépitos convertidos em cortiços que servem de moradia aos mais pobres. Relatos de furtos e roubos ali são frequentes, e os montevidanos não tem uma boa impressão do bairro, o que é uma pena, pois sem dúvida nenhuma é uma região que seria muito agradável de morar se fosse mais bem cuidada. Há semelhanças com a Zona Portuária do Rio de Janeiro, hoje em processo de revitalização urbana.
A peatonal Sarandi atravessa a Plaza Constitucion, o lugar de fundação da cidade, a “Plaza de Armas” da capital uruguaia, que reúne o prédio do Cabildo, a primeira sede do governo local (em obras nesse dia), e a Catedral Metropolitana.
Nota: A maioria das cidades fundadas por espanhóis na América se desenvolveram a partir dessas praças centrais, chamadas na época de Plaza Mayor, que reuniam as sedes das duas grandes autoridades da época: A Igreja e o Governo. Na Espanha ainda se manteve o nome de Plaza Mayor, mas nos países da América Espanhola elas são conhecidas como Plaza de Armas, pois nas cidades ali era o local em que se iniciaram os processos de revolta do povo contra o governo espanhol. Algumas cidades homenagearam os heróis da revolução como a Plaza Bolívar em Bogotá. Nos dias de hoje elas ainda preservam a mesma estrutura original, com a principal igreja da cidade e antigos prédios públicos, e são o marco central da cidade.
Segui pela peatonal Sarandí até o seu fim na Plaza Independencia, considerada o coração de Montevideo por muita gente. Ladeada por palmeiras e cercada de grandes prédios, ela marca o limite da Cidade Velha com o Centro, mais moderno. Era ali que se localizava a antiga muralha durante o período colonial, e hoje ainda há uma réplica do portal original da antiga cidade na entrada para a Peatonal. No lado sul da praça há a sede da presidência uruguaia, equivalente ao nosso Palácio do Planalto, um grande edifício envidraçado. Próximo a ele está o Teatro Solis, o maior do país, reúne mais de 100 anos de história e um importante ponto cultural da cidade.  nos bancos próximos ao chafariz batendo papo e jogando cartas – até a principal praça do país preserva um pouco de ar interiorano. No lado leste da praça está o edifício Salvo, de 1908, o primeiro edifício considerado arranha-céu da cidade, e aonde desemboca a Avenida 18 de Julho, a principal artéria do Centro.
Teatro Sólis
Naquela hora a praça estava cheia de turistas, muitos brasileiros principalmente tirando selfies aqui e ali, mas também haviam os moradores locais sentados
A 18 de Julho é uma avenida bem interessante, ela reúne um grande movimento de pessoas, veículos, restaurantes, comércio e casas de shows. A maioria ainda estava lentamente abrindo as portas já que ainda era manhã de um feriado. A arquitetura dos edifícios é outra atração a parte, muitos decorados com estátuas e domos nos terraços. Todos esses detalhes me fizeram lembrar de outras avenidas importantes como a Santa Fé de Buenos Aires ou a Gran Via de Madrid.
 Passei pela Plaza Fabini, onde dois dias atrás assisti ao show de tango ao ar livre (ver post: http://migre.me/qrtf3) e segui até a Plaza Cagancha, onde está a sede da Intendencia (prefeitura) de Montevidéu, todas essas praças estavam bem cuidadas e limpas. Há um chafariz cheio de cadeados do amor, a exemplo da Ponte des Arts em Paris (hábito muito brega na minha opinião) Segui para o norte pela Avenida General Rondeau e depois pela Libertador Lavalleja em direção ao Palácio Legislativo, o movimento ficou bem mais esparso, o comércio some, e as ruas ficam mais abertas. O ruim é que esse lado do Centro está de costas para o rio, fora do alcance da brisa, o relógio de rua já estava marcando 35 graus. Passei ao lado da estação ferroviária General Artigas, parecida com a Estação da Leopoldina no Rio de Janeiro, um prédio imponente cinzento abandonado. Ainda há trens de subúrbio em Montevideo, movidos a diesel, que partem de uma plataforma a 300 metros a frente da estação rumo ao norte da cidade.
Estacion General Artigas

Depois de uma boa caminhada cheguei a enorme praça em que se localiza o Palácio Legislativo, a maior edificação da cidade, em estilo clássico, no topo de uma pequena colina, sendo visível desde muitos pontos da cidade, reunindo o Senado e a Câmara dos Deputados. Próximo a ele está o edifício mais moderno do Uruguai, o edifício Antel, todo envidraçado e de forma chamativa.
Palácio Legislativo e Edifício Antel

Seguindo algumas quadras mais além do Palácio cheguei ao Mercado Agrícola, mais amplo que o Mercado del Puerto e com uma aparência mais reformada, com ar-condicionado e muitas bancas de vegetais, especiarias, carnes, peixes e artesanato. Havia muitos restaurantes também, mas a maioria mais focada em fast-food, com praça de alimentação, só havia uma churrascaria e estava lotada. Por mais agradável que fosse, preferi pegar um ônibus (162 Ciudad Vieja) e voltar para o Mercado del Puerto, com mais opções de restaurantes, naquela hora já bastante movimentado.
Mercado Agrícola, uma alternativa ao do Porto

Para comer nos restaurantes, ou você senta no balcão ou usa as mesas. Como estava sozinho, nem pensei duas vezes em usar o balcão. Pedi para a atendente uma Costilla (acompanha papas –batatas- fritas) e separado uma morcilla, uma linguiça de sangue. Ambos os pratos estavam muy, muy ricos!
Ainda ajudei um casal de brasileiros que estava meio perdido no que ia escolher. Lembrando que a picaña deles não é como a nossa picanha e bife de chorizo é um corte argentino e eles não o servem, a melhor pedida lá pra dois é o bife ancho.


3-A Tarde
A caminhada da tarde para fazer a digestão teve o mesmo início da de manhã, seguindo pelas peatonais até a Plaza Independencia, agora já com bastante movimento de gente e ainda mais camelôs. Comprei em um deles na Plaza Constitucion uma camiseta de souvenir por 20 reais (sim, aceitou a moeda brasileira). Chegando na Independencia, desviei para o sul e desci até a Rambla, de onde segui tranquilamente até o Parque Rodó, já em Punta Carretas, foram cerca de 3 km de caminhada sob o sol temperado pela brisa, acompanhando as águas barrentas do Rio da Prata. As ramblas de Montevideo oferecem grandes visuais, são mais de 20 km de orla e os locais gostam de caminhar e de pedalar nela, mas achei a rambla naquele trecho da Cidade Velha e do Centro muito isolada, já que são poucos os semáforos com faixas de pedestres que atravessam a avenida e não havia um quiosque ou um ambulante vendendo bebidas. Tive que atravessar a avenida fora da faixa para comprar uma água num posto de gasolina. Não é muito convidativo desse jeito.
La Rambla Argentina, entre o Centro e Punta Carretas
Chegando ao Parque Rodó há a Playa Ramirez, bem ocupada de barracas e cadeiras de praia, ladeada pelo prédio do Parlamento do Mercosul. Atravessei o Parque admirando a vista das palmeiras e dos bustos espalhados pelas alamedas. Para me adiantar um pouco, peguei um ônibus (582 Pocitos) até o seu ponto final na orla deste bairro, o principal da orla montevidana, cuja praia movimentada é rodeada de prédios. Pelo menos ali havia um quiosque vendendo água. Não longe da praia há o Shopping Montevideo, ladeado pelo empreendimento WTC, que rivaliza com o edifício Antel o título de mais moderno do país.
Orla de Pocitos
Mesmo sendo o bairro mais badalado da cidade, a efeito de comparação com Ipanema ou Copacabana no Rio ou mesmo Palermo em Buenos Aires, Pocitos é muito calmo, seguindo aquele estilo de comércio esparso e ruas tranquilas. Acredito que os dois shoppings da área (Montevideo e Punta Carretas) possam ter contribuído para o declínio do comércio de rua, uma pena. Queria ainda ter passado pela região do Estádio Centenário e do Parque Battle, mas já eram 17:00 e precisava estar no máximo até as 19:00 no Terminal Tres Cruces, portanto decidi já me dirigir para lá para pegar o ônibus que me levaria de volta ao Brasil naquela noite, encarando 12 horas de viagem até Porto Alegre.
4-A volta para o Brasil na primeira classe do busão
Aproveitando que cheguei cedo, por volta das 17:30, jantei um Whooper no Burger King e segui para o balcão da EGA, onde peguei uma boa fila para fazer o controle de embarque no guichê da empresa, onde você mostra sua passagem e entrega o passaporte para os funcionários da empresa, que farão todo o processo de saída do Uruguai (não esqueçam de manter o papelzinho da imigração todo o tempo junto com o passaporte).
Todos os dias há viagens entre Porto Alegre e Montevideo, pela EGA a passagem custa R$ 194 a executiva e 291 a primeira classe, no andar de baixo (há uma outra empresa que também faz esse percurso, a TTL). Achei jogo gastar esse dinheiro a mais para ter uma boa noite de sono já que ainda iria bater perna o dia todo na capital gaúcha antes de pegar o voo de volta para São Paulo.
Viagem internacional na 1ªclasse? Por enquanto só no buzão
O ônibus partiu pontualmente as 20:00 de Tres Cruces e pegou alguns passageiros já com bilhetes nas avenidas de saída de Montevideo. Fiquei admirando minhas últimas vistas do Uruguai na janela antes que escurecesse totalmente. A viagem em si foi excelente, a poltrona reclinando quase 180 graus e sendo servido jantar a bordo, uma boa carne com batatas acompanhada de bebidas (refrigerante, uísque ou Martini). Fui logo de uísque para capotar de sono mais rápido.

A impressão final que ficou de Montevideu para mim foi a de uma metrópole ainda apegada a um ritmo de vida mais devagar. A ausência de grandes infraestruturas de transporte como autopistas e metrôs atravessando a cidade e em seu lugar predominando largas ruas com semáforos, comércio local diversificado e com boas calçadas ladeadas por árvores frondosas fez com que os veículos não andem tão depressa, mas evitou que o espaço urbano fosse segregado da forma que acontece em locais atravessados por ferrovias e rodovias, fazendo com que os bairros mantenham sua dinâmica por períodos mais longos de tempo. No próximo post concluo o relato da viagem com o minha quarta-feira de cinzas em Porto Alegre, a minha primeira vez no Rio Grande do Sul. Continuem seguindo!

Quanto aos mapas, aqui vai o link do aplicativo da série de mapas referente ao Uruguai. Os meus passos em Montevideu estão no mapa número 4:

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Viagem ao Uruguai 2015: Colonia de muitas culturas

O pacato, bonito e bem-conservado centro histórico de Colônia do Sacramento - declarado patrimônio mundial pela UNESCO em 1995-  já foi um dos mais importantes pontos estratégicos durante a era da colonização na América do Sul. Localizada às margens do Rio da Prata, no início de sua foz imensa, era um ponto importante nas rotas dos espanhóis que levavam as riquezas coletadas desde rio acima para a Europa. A mais importante delas era a prata coletada nos altiplanos bolivianos, na cidade de Potosi (está na minha lista de destinos a se conhecer), e que deu nome ao rio que banha Colonia. Nas minhas viagens a Espanha vi o uso abundante da prata e de outros metais preciosos coletados nessa região e em outros pontos dos vice-reinados espanhóis em enormes catedrais e nos palácios da Coroa espanhola, transmite um poder e um fascínio tremendo.
Rio de La Plata














Tendo em vista a importância dessa rota na exploração de riquezas e no controle do território, foram os portugueses os fundadores de Colonia, em expedições chefiadas pela Capitania do Rio de Janeiro em 1680. Foi a primeira cidade fundada por europeus no que é hoje o território uruguaio, e sua proximidade com Buenos Aires, que era naquele momento a principal cidade espanhola do rio da prata, causou enorme receio entre os espanhóis, e as reações vieram logo em seguida. Até 1750 a cidade sofreu com ao menos duas ocupações espanholas mas conseguiu prosperar sob mãos portuguesas como um ponto de comércio e de contrabando de riquezas principalmente entre Portugal e Inglaterra. Porém nesse ano foi estabelecido entre as duas nações ibéricas o tratado de Madrid, em que o controle formal da cidade foi entregue às mãos espanholas, e em troca Portugal recebia o território das sete missões jesuítas orientais, o que hoje é o oeste do Rio Grande do Sul, onde há as ruínas de São Miguel das Missões. Isso não impediu ainda outros confrontos entre espanhóis, portugueses e ingleses, sendo o mais significativo deles a ocupação pelas tropas de Dom João VI quando a Coroa portuguesa estava sediada no Rio de Janeiro, e depois em 1822 foi para o domínio brasileiro. Ou seja, nessa disputa toda Colonia, assim como o Uruguai, já formaram parte do Brasil, até 1828, com a independência uruguaia.













Hoje já não desce mais prata pelo rio, mas o porto de Colonia continua bastante movimentado. É dali que saem a maioria dos ferryboats entre o Uruguai e a Argentina,  transportando muitos passageiros e cargas. Essa travessia frequente e relativamente curta - 40 km de distância superados entre 1 e 3 horas dependendo da embarcação- fez com que muitos argentinos adquirissem propriedades e negócios na cidade, e também com que haja um movimento de turistas intenso entre os dois países. Aliado a rica história por trás da cidade, faz com que Colonia seja um ponto chave não só dentro do Uruguai mas como de todo o Mercosul.













Depois desse feedback todo, vamos ao relato do meu bate-e-volta desde Montevideu até Colônia.


Dia 16/02/2015 - 9:00
Saindo do Hostel Montevideo Up as 8:15 da manhã, nem tomei café direito devido a pressa, uma rápida viagem de 10 minutos de ônibus pela Boulevard General Artigas me deixou em frente ao terminal Tres Cruces. São duas as empresas que fazem o trajeto para Colonia: A COT e a TURIL. Peguei o saiu as 9:00 da COT, mas preciso aqui fazer uma observação: No caso da COT a ida saíram dois ônibus para Colonia as nove, um directo e um parador. Como eu não sabia disso a atendente me colocou no parador. Peçam e insistam sempre no direto, porque são 40 minutos a mais de viagem no parador atendendo as cidadezinhas as margens da autopista! O preço de cada perna foi de 224 pesos (448 pesos ida e volta no total, cerca de 56 reais, achei bem barato para os 360 km percorridos no total da ida e da volta.
Ônibus da Turil na Rodoviária de Colônia rumo a Montevideu














O lado bom de parar nas cidadezinhas rurais é que você pode admirar os habitantes locais, muitos tinham aquele traje de gaúcho típico com chapéu, camisa xadrez e botas e com a cuia sempre ao alcance pro mate, muita gente cavalgando pelas ruelas, um comércio ralo, e muitos campos de cultivo entre uma cidade e outra. O itinerário é quase uma linha reta e o relevo, quase sempre plano. Quase chegando a Colonia, a autopista se estreita em uma estrada de mão dupla ladeada por palmeiras até a entrada da cidade, cerca de uns 10 quilômetros, muito bonito. Após atravessar uns bairros mais novos, o ônibus adentrou na Rodoviária de Colonia as 12:20, parecida esteticamente com a de Punta, a base de tijolos e equipada com café, guarda-volumes e banca de jornais. Como o ônibus que eu vim estava cheio de turistas, reservei logo a volta para MVD no guichê da COT ali para as 17:00, em um direto.
O Porto de Colonia fica logo ao lado da Rodoviária, uma grande construção moderna. Aos fundos estava atracando o barco grande da Buquebus, a principal companhia que faz a travessia, e os carros já estavam formando fila na entrada do porto para embarcar rumo a Buenos Aires.
Porto de Colonia














Segui adiante, passei por uma pracinha em frente a rodoviária onde há um ponto de tuk-tuks e mototaxis para levar aqueles que não querem encarar as 5, 6 quadras de caminhada até o Centro Histórico. Preferi seguir a pé pela Calle Manuel Lobo, homenageando o português fundador da cidade, com belas construções aparentemente da primeira metade do século XX e ladeada por árvores, o pouco movimento de carros passando junto com o sopro do vento dos galhos e as folhas no chão transmite -mais uma vez nessa viagem ao Uruguai- uma tranquilidade muito grande. Numa das esquinas estava estacionado um calhambeque todo rodeado de folhas, pareceu quase uma viagem no tempo. Essa região entre a Rodoviária e o Centro Histórico tem muitas opções de hospedagem, principalmente hostels.



















A Manuel Lobo termina na principal entrada da antiga cidade: O portão da antiga muralha portuguesa, ainda imponente, recebendo os visitantes há mais de 3 séculos. Após adentrar segui acompanhando a muralha por dentro até ela terminar em um pequeno jardim escondido às margens do rio. Segui pela orla do rio e entrei em um dos cartões-postais da cidade: A Calle de Los Suspiros, calçada em pé-de-moleque e casas de pedra ordenadas com pequenos azulejos em alguns pontos, praticamente intacta desde os tempos da fundação portuguesa, hoje repleta de lojas de artesanato.
Calle de Los Suspiros














No final, a rua termina na Plaza Mayor, ampla e repleta de restaurantes ao ar aberto. Nela estão três importantes atrações da cidade: O Museu Português, o Museu Municipal e o Farol. Achei os dois primeiros bem parecidos, focando seus acervos na história e no modo da vida da cidade durante toda aquela alternância de poder entre português e espanhóis. Já o Farol, localizado sobre as ruínas portuguesas da antiga igreja de São Francisco, tem uma vista interessante de toda a cidade.
A semelhança de Montevideu e Punta, Colonia também se localiza em uma ponta que se destaca sobre o rio, e sua praça principal, a Mayor, se localiza bem no meio desta (assim como a Plaza Independência de MVD e a Pza.Artigas de Punta) , de tal modo que fica fácil se orientar pela cidade a partir dela. Me pareceu que ao sul da Praça se concentram as construções portuguesas, e a norte as espanholas.
Plaza Mayor


A Catedral de Colonia se localiza próxima à Praça, e ela se destaca por ter sido reconstruída por completo pelos espanhóis após 1750, e da antiga catedral portuguesa restaram apenas a entrada e uma das pilastras. Em frente a ela há dois calhambeques convertidos em estufas para o cultivo de plantas ornamentais. Ao lado da Catedral há outra praça importante, a da antiga residência do governador português, da qual hoje só restam as ruínas da fundação.
Catdral de Colonia com a entrada portuguesa


Um dos principais marcos de Colonia são as lamparinas das ruas, espalhadas por quase todas as casas, que em conjunto com o calçamento e as construções antigas formam um dos cartões-postais da cidade. Outro marco são, como dito acima, são os carros antigos espalhados pelas quadras aqui e ali.
Rumando mais para o norte, na esquina com a Avenida General Artigas, chega-se a uma área com traços mais espanhóis, com as casas de dois pisos completamente brancas e com as pequenas sacadas com gradis. É ali que está o museu espanhol (na Calle España) e a marina da cidade.
Construções de estilo espanhol do Centro Histórico














 Ao redor da Avenida General Artigas existem muitos restaurantes e lojinhas de souvenirs, mas quanto mais se seguir por ela mais se afasta do Centro Histórico. As ruas transversais também reúnem opções de serviços e restaurantes a um preço mais em conta, onde acabei almoçando um belo de um bife com molho de pimenta.
Carrinhos elétricos também são uma opção de deslocamento 














Continuei o dia passeando tranquilamente por cada trecho do Centro Histórico, aproveitando o sol e a brisa agradável, e minha última parada foi para um sorvete de doce de leite em frente a muralha. As 17:00 já estava a bordo do ônibus direto para MVD, mais confortável que o parador, com WiFi gratis a bordo. Depois de 2 horas e 40 minutos de viagem cheguei ao Shopping-Terminal Tres Cruces, acabei comendo duas fatias de pizza na praça de alimentação e voltei para o hostel.

A impressão final que tive de Colonia foi a de uma cidade que conseguiu preservar os detalhes de sua rica histórica de uma forma impressionante, pois hoje a cidade está situada bem entre as capitais porteñas, mas o modo de vida pacato foi pouco alterado e a cidade em si hoje não é muito extensa. Esse investimento na preservação do Centro Histórico é o responsável por continuar a movimentar o fluxo de turistas de diversos tipos, seja o dos locais argentinos e uruguaios, seja os que vem de mais longe para admirar a arquitetura de duas colonizações -portuguesa e espanhola- convivendo dentro do mesmo espaço.
Aqui vai o link para o aplicativo que eu criei com os mapas que eu fiz dos lugares visitados no Uruguai. O mapa 3 mostra o meu roteiro realizado em Colonia:

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Dia 15/02/2015 - A dualidade de Punta Del Este e tango ao ar livre de Montevidéu.

Cheguei na Rodoviária de Punta meio sacolejado depois de encarar a mais longa viagem de ônibus da minha vida. Mesmo eu já estava de saco cheio e cansado. Nada que uma água no rosto e um pão acompanhado de um café na lanchonete não resolvesse. A rodoviária é estrategicamente localizada, na entrada da cidade e em frente a orla da Playa Brava, o que facilita o deslocamento para as atrações locais. Fiz a volta inteira dentro da península e levei cerca de 2 horas e meia, seguindo um ritmo relaxado, apreciando o lugar.
Playa de Los Ingleses
Saindo da Rodoviária, atravessando a avenida, há o famoso Monumento al Ahogado, aquela mão brotando das areias da praia simulando um afogamento, uma homenagem aos que perdem a vida nas águas do mar todos os anos, e que nos deixa aquele lembrete de sempre ter cautela nas praias.
O tempo de início não estava muito animador, encoberto e com muito vento, e ao longe se viam as nuvens derramando a chuva. Talvez isso junto com o fato de ser uma cidade bem notívaga fez com que a cidade ainda parecesse estar meio adormecida, com parte do comércio na área ainda fechado, apesar de serem pouco depois das nove horas.
Tratei de continuar a caminhada pela rambla (calçadão em espanhol) do lado oceânico da península, onde de início a aparência era como a de um típico balneário movimentado, com altos edifícios ladeando a orla e quiosques espalhados a cada centena de metros mais ou menos, e onde já havia mais movimento de gente caminhando e correndo. Na próxima praia, a dos Ingleses, mais repleta de pedras, havia uma concentração um pouco maior de gente nas areias tomando aquele sol meio encoberto. No final da praia há um altar nas rochas em homenagem a Nossa Senhora da Candelária, padroeira da cidade.
Continuei a seguir em direção a ponta e após essa praia, é possível perceber uma mudança na orla, onde os edifícios que a rodeavam dão espaço a grandes casas, a maioria ajardinadas e algumas forradas com madeira, me remetendo mais a cidades litorâneas de locais de clima mais frio. Também o movimento de gente diminui e os quiosques rareiam. Resolvi seguir adentro da Península por uma quadra e encontrei uma praça bem tranquila, com uma igreja metodista chamando os fieis para a missa das 10.
Segui de volta para o calçadão até chegar de fato no extremo da península, onde há, oficialmente, o encontro das águas do Rio da Prata com o Oceano Atlântico. É visível a diferença da ondulação a medida em que se caminha em direção ao rio. E foi ali que aquela chuva que ameaçava cair finalmente deu as caras, tive que me abrigar embaixo de uma garagem de uma das casas junto com outros transeuntes até dar uma trégua. Sorte que não demorou mais que 15 minutos, e o sol apareceu rápido, embora ainda ventasse muito, logo deu para continuar o giro, agora pela orla voltada para o rio.
Final da Punta











Esse trecho da orla não possui praias dentro da península, e é nele em que está a Marina de Punta, e em frente a ela tem vários restaurantes que no momento serviam o desayuno (café da manhã), mas que pela aparência são focados mais na boemia, com áreas abertas, talvez um bom lugar para curtir a noite. Também é ali que está o prédio da intendência (prefeitura) de Punta.
Dali se percebe bem a diferença entre as duas áreas principais da cidade, ao sul predominam exclusivamente as casas; e ao norte, os edifícios. Resolvi seguir por dentro da península, entrando na Calle Gorberó e caindo na Plaza Artigas, ladeada de palmeiras e com um centro local de artesanato, meio mixuruca.
Plaza Artigas














Após a praça, a Calle Gorberó mostra uma variedade muito grande de serviços, com grifes de alto padrão, restaurantes diversos -desde comida mediterrânea até McDonalds- e casas de show e boates. Também tem muitas casas de câmbio e lojas de souvenir, esse todo conjunto fazendo com que a Calle Gorberó seja o coração turístico da cidade, repleto de brasileiros e argentinos (identificados pelas placas dos carros e pelas camisas de futebol). Mas os preços não são muito amigáveis, uma simples garrafa de água sem gás me custou 40 pesos - cerca de 5 reais - em um mercadinho em uma das ruas transversais. Os desayunos nos restaurantes tinham preços acima dos 200 pesos, e a casa de câmbio da Rodoviária tinha uma cotação ligeiramente melhor.
Calle Gorberó














A Calle Gorberó termina na Plaza Pan-Americana, na entrada da península e em frente a Rodoviária. Como ainda era cedo, resolvi seguir por trás da Rodoviária, indo parar no começo da Playa Mansa, uma praia bem extensa e já naquela hora bem frequentada, com os banhistas aproveitando bem o sol, que aparecia ali já bem forte, e as águas bem calmas. A orla é rodeada por grandes edifícios e é acompanhada na areia por uma caminho ecológico, construído de forma elevada sobre a vegetação nativa da praia, levando até a um cais de onde saem passeios de barco até a Ilha em frente.
Playa Mansa














Fiz hora por ali até por volta da 13:30, voltei para a Rodoviária e comprei passagens para as 14:00 pela empresa COPSA para Montevideu- as saídas para a capital são bem frequentes e custaram 214 pesos.
As minhas observações finais enquanto deixava Punta foram as duas paisagens contrastantes que convivem dentro da pequena península: A área edificada cheia de movimento e serviços voltada para o litoral de mar agitado, e da ponta tranquila repleta de casas ajardinadas voltada para o litoral do Rio da Prata, quase como as duas faces da mesma moeda. Outras atrações mais distantes como a Casapueblo, Cerro Pan de Azucar e Piriápolis ficarão para a próxima.
Terminal Rodoviário de Punta del Este














16:00-Montevideu

A rodovia entre Punta e MVD é muito tranquila, pista dupla com pedágios, e o relevo quase sempre plano. A entrada em Montevideu se dá pela Avenida Itália, que atravessa os bairros a leste da cidade e termina junto ao Terminal Rodoviario Tres Cruces, que é localizado estrategicamente na entrada do Centro, junto as saídas a leste, norte e sul. Já que o Uruguai não é lá muito grande, ele é o principal nó dos transportes de passageiros dentro do país (os aeroportos são praticamente exclusivos para os vôos do exterior), construído sob um shopping também bem movimentado. São muitas as empresas que operam e há saídas e chegadas de ônibus a todo momento, mas consegue manter uma boa organização e limpeza.
Terminal-Shopping Tres Cruces

 A principal saída do terminal-shopping dá na Boulevard General Artigas, que atravessa a cidade de norte a sul. No ponto tomei uma linha para Punta Carretas, o ônibus 174 (xô, mau agouro!) que seguiu ao sul pela General Artigas até o ponto final, junto ao litoral e um campo de golfe. É um bairro bem nobre, com grandes edifícios. Segui por uma transversal da General Artigas paralela ao litoral e encontrei o meu hostal, o Montevideo UP!, em uma casa numa pequena rua escondida, a só 1 quadra do mar. A recepcionista foi prestativa e me indicou o meu quarto, no segundo andar da casa, voltada para o quintal, onde a brisa marítima entrava forte. Tomei um merecido banho e tirei um cochilo.
Punta Carretas














As 18:30 levantei e o dia ainda estava claro, resolvi dar uma esticada pela cidade, primeiro passei pela ajardinada e pedregosa orla junto a Rambla de Punta Carretas e seu farol, depois peguei um ônibus que vinha escrito "Citatela", que é dentro da Cidade Velha, mas desci na 18 de Julho, a famosa avenida das lojas e da arquitetura monumental de Montevideu. Achei parecida com muitas avenidas de Buenos Aires, como a Santa Fé, muito comércio de rua e movimento nas calçadas.
Tango ao ar livre na Plaza Fabin














Quando cheguei na Plaza Fabin, havia um espetáculo ao ar livre de tango, até hoje não sei sob qual iniciativa, mas haviam caixas de som na praça tocando tango e muitos casais, especialmente idosos, dançando tranquilamente, mas bem entrosados e seguindo os passos a risca. Pensei no inevitável contraste com o Brasil, que naquela hora o povo todo também devia estar nas ruas dançando, mas só que pulando samba nos blocos na maior alegria e descontração.
Terminei na Plaza Independencia, a principal da cidade, sobre a qual falarei nas próximas postagens. Como já eram 20:00, retornei para Punta Carretas, jantando em um Shopping no bairro a poucas quadras do hostel que já foi um antigo presídio.
Antigo portão do presídio, convertido na entrada do Shopping




















No próximo post contarei como foi minha experiência no dia seguinte quando fiz um bate e volta a Colônia do Sacramento, a mais bem preservada cidade colonial uruguaia, fundada pelos portugueses e depois teve seu controle alternado com os espanhóis em inúmeras disputas, passando sob breve domínio brasileiro após o 7 de setembro até a independência do Uruguai.
Aqui abaixo disponibilizo o link para o aplicativo contendo os mapas da viagem ao Uruguai, o número 2 mostra o meu passo a passo em Punta del Este. Espero que gostem!