sábado, 26 de março de 2016

Viagem a Bolívia parte 3: A chegada em La Paz rompendo a barreira dos 4000 metros de altitude



Só a chegada na capital boliviana é algo que já faz a viagem valer a pena, a sensação de se avistar aquela cidade tão extensa em um lugar tão alto, encaixada numa paisagem árida entre vales e montanhas e ao longe ladeada por imensos nevados imponentes, parece mesmo uma espécie de fronteira do espaço habitável, um lugar no limite de onde a natureza permite que a vida se desenvolva.
Os vales e desfiladeiros que abrigam boa parte da cidade de La Paz parecem protegê-la do ambiente inóspito nos arredores, mas não inóspito o suficiente para evitar a ocupação urbana desordenada. É na periferia de El Alto, espalhada pelo altiplano e em encostas a uma altitude de 4000 metros, exposta ao vento, ao frio e ao ar rarefeito, que reside quase metade da população paceña, e é também a principal porta de entrada e saída da La Paz, abrigando o Aeroporto Internacional e a chegada da maior parte das rodovias que partem da cidade, seguindo para Cochabamba, Santa Cruz, Potosi, Sucre, Uyuni, Copacabana, Lago Titicaca, Peru e Argentina. Ou seja, a recepção em La Paz é sempre feita por El Alto, ou seja, por cima!

Vamos ao relato da viagem depois do reveillón molenga de Cochabamba:

Dia 01/01
Fizemos check-out do hostal Zabidi e voltamos ao Terminal de Ônibus, a duas quadras dali. O café foi alguns biscoitos de viagem. Embarcamos para La Paz as 10 da manhã na viação Bolivar, operada por um ônibus da empresa Trans Gaivotas, por 80 Bolivianos (45 reais). O ônibus era meio antigo, mas com boas poltronas leito e sem ar-condicionado, mas ali no frio de altitude isso não fez diferença.
Terminal de Buses de Cochabamba

Ainda no vale de Cochabamba, na periferia da cidade, ele parou em mais uns dois escritórios da empresa para embarcar passageiros, no primeiro pedágio da estrada enquanto o ônibus esperava na fila vieram várias mulheres vendendo pratos embalados de frango asado com arroz e salada por 15 bolivianos (8 reais), e como não tinha tomado café direito e tava com fome, resolvi comprar e almoçar ali mesmo, a bordo do buzão.
Frango assado com arroz e salada embalado e vendido na beira de estrada

A primeira parte da viagem se dá na maior parte em uma subida muito sinuosa e próxima a precipícios, em umas montanhas bem secas, com cactos brotando aqui e ali.

Paisagem do Vale de Cochabamba
Sorte que por ser 1º de Janeiro a estrada estava vazia, quase sem caminhões. A vista foi se abrinda cada vez melhor a medida em que se subia, assim como a dor de cabeça da altitude, aliviada depois de uma hora de cochilo. Houve uma parada em um vilarejo já a 4.300 metros de altitude, para uma ida rápida no banheiro e comprar uns lanches e bebidas nos vendedores às margens da estrada.


Pelo caminho já começaram a aparecer as lhamas e alpacas, pastando em quintais cercados por muros de pedras e algumas construções de adobe e barro, da cor cinzenta da montanhas ao redor.





Depois de umas 5 horas de viagem a paisagem muda de repente e a estrada entra no famoso altiplano, uma vasta área plana no meio da cordilheira, e o enjôo das curvas passa. Mais uns 15 minutos o ônibus para em El Caracollo, uma cidade mais movimentada onde alguns passageiros descem e depois entra na única autoestrada do país, que liga La Paz a cidade de Oruro, atravessando o altiplano e muitas vilas rurais no caminho, relativamente nova e em bom estado, a partir dali a viagem fica bem mais tranquila.

A última hora da viagem é a com os melhores visuais. A medida em que nos aproximamos de La Paz começa a aparecer a direita e na frente do ônibus uma grande linha da Cordilheira dos Andes chamada de Cordillera Real, com vários picos nevados, o maior e o mais destacado deles é o Illimani, com 6430 metros, e o que estava mais próximo da rodovia.









Em El Alto foi onde a maioria dos passageiros desceu, em uma rua que serve como terminal de ônibus. É uma cidade bastante movimentada, mesmo no dia primeiro de Janeiro.
A rodovia entre El Alto e La Paz é por si só uma atração. Assim que ela começa a descer em direção a La Paz 400 metros desfiladeiro abaixo há um grande visual a direita da cidade com o Monte Illimani ao fundo, sendo o principal cartão-postal da cidade.

La Paz


As 17:00 o ônibus parou em frente ao Terminal de ônibus, fechado por ser 1º de Janeiro (aí foi quando eu pensei que devia ser um feriado ainda mais especial na cidade, afinal é o dia mundial da paz, em La Paz).

Me despedi do Lucas e do Mychel e fui para o hostel Copacabana, não muito longe do Terminal. Pelo menos não tive que subir ladeira, o que faz toda a diferença. O quarto era cômodo embora um pouco pequeno, sinal de wifi bom, cama larga e com banheiro privativo com água quente no chuveiro (demorava uns minutos para esquentar, mas não vacilava) por 85 bolivianos a diária (cerca de 48 reais), e com o café da manhã incluso.
Depois de umas duas horas descansando fui dar um giro pela cidade.

Primeiras experiências e observações de La Paz:

O hostal fica na Avenida Illampu, cheia de comércio, restaurantes e agências de turismo, com um trânsito meio caótico e cheia de ambulantes, principalmente em uma rotatória próxima ao hotel, parecia um ponto convergente do caos.
O aroma daquela região da cidade é uma mistura de vários fatores:
-O cheiro de frutas que são vendidas nas barracas ou no caso de laranjas espremidas na hora para fazer suco
-O cheiro de poluição e fuligem dos carros e dos ônibus velhos
-O cheiro de óleo de fritura das barraquinhas de frango frito e hamburguesas.
-O cheiro de lixo acumulado aqui e ali nas calçadas e no meio-fio.
 A população indígena é predominante na área, com muitas cholas carregando seus sacos ou servindo como ambulantes vendendo de tudo desde frutas, tecidos andinos até roupas de grife made in China e eletrônicos, e com muitos mendicando ao meio-fio, especialmente crianças e idosos . Pode ser um choque e tanto para quem nunca saiu do Brasil antes, mas já tinha outras experiências na América Latina aliviaram um pouco esse impacto, mas até ali era inegável que a Bolívia era até o momento o país mais pobre que já havia visitado.
Mas mesmo assim, vi alguns bons sinais de infra-estrutura de qualidade na minha viagem. O asfalto das ruas era bem-conservado, haviam equipes de limpeza e lixeiras nas ruas (também deve ter algum fator cultural em jogar o lixo na rua), além de sinais de classe média e de consumo como muitos serviços mais especializados como dentistas, cirurgias de estética, cursos de linguística, de graduação, pós-graduação, tecnologia e muitas lanhouses e pontos de wifi livre, e muita gente com um celular na mão, inclusive os de aparência mais rústica.
Há muitos turistas estrangeiros também, além de brasileiros e outros sul-americanos. Percebi em muitos grupos de europeus (principalmente franceses, ingleses e italianos), canadenses e estadunidenses, e até alguns asiáticos. Muitos vem em pacotes de tamanho variado que incluem Peru e Bolívia, passando por La Paz, Lago Titicaca, Cusco, Machu Picchu, Lima, Nazca, Arequipa, Atacama, Uyuni, Potosi, Sucre, Amazônia, dependendo da duração do roteiro e dos valores.

Perto do hotel há o Mercado de Las Brujas, uma rua estreita cheia de lojas de artesanato, tecidos de lhama e alpaca e de ervas e temperos exóticos, mas naquela hora já estavam fechando as portas. Desci pela Calle Sagarnaga, outra cheia de agências de turismo, até atingir a Plaza Mayor de San Francisco, na parte mais baixa do Centro, com uma Igreja do período colonial de fachada bem bonita. É uma praça bem movimentada, cheia de artistas de rua e de vendedores. Segui para o outro lado do Centro, até a Plaza Murillo, a antiga Plaza de Armas da cidade, com o Palácio del Gobierno Boliviano, a prefeitura de La Paz e a Catedral Metropolitana. É uma praça bonita, ajardinada, e na época com uma decoração de natal chamativa, com muitas crianças correndo pra lá e pra cá.
Jantei em um Subway a duas quadras dali e voltei para o hostel.
Plaza Murillo


Na próxima postagem falo mais a respeito de La Paz, sobre sua geografia, as atrações turísticas que fui e de seu sistema de transporte. Até mais!